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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Exército terá que pagar pensão a juiz-forano

A 2ª Vara Federal de Juiz de Fora determinou, ao Exército Brasileiro, o pagamento de pensão a José Américo Grippi, de 66 anos. A decisão, considerada emblemática no país, foi tomada a partir do reconhecimento de que ele viveu uma união estável com um capitão do Exército, falecido em 1999 na cidade. A medida faz com que o juiz-forano sinta-se como um verdadeiro vencedor. "É um passo muito grande para as pessoas que estiverem no mesmo caminho também terem a oportunidade de serem felizes e compreendidas. Minha irmã sempre me dizia que eu estava sofrendo muito, mas que eu deixaria um caminho aberto para as pessoas que viessem depois de mim. O amor não tem sexo, não tem cor, não tem bandeira. Amor é simplesmente amor." A notícia ganhou repercussão em blogs especializados em direito e até espaço em uma coluna do jornalista Ancelmo Gois, do jornal "O Globo". Grippi passará a dividir a pensão com duas irmãs do capitão, as quais já contavam com o benefício. A expectativa é de que o novo beneficiário entre na folha de pagamento do Exército até o próximo mês.

O relacionamento começou quando Grippi tinha 20 anos, e o companheiro, 30. "Vivemos juntos durante 35 anos. A gente não só se amava muito, como nos respeitávamos muito. Ele era uma pessoa muito boa para mim e para minha família." Dessa época, uma das recordações guardadas com maior carinho foi o reconhecimento da união pela sogra, enquanto ela estava internada em um hospital. "Ela pegou a minha mão, a mão dele, e falou assim: 'José, faça pelo meu filho o que eu não vou poder fazer mais. Eu abençoo essa união. Para mim, vocês estão casados'", conta, emocionado.

O beneficiário relata ainda que perdeu seu companheiro em 5 de janeiro de 1999. "Quando ele ficou doente, fui tratar dele no Hospital Militar durante 28 dias. Lá, ele foi piorando até morrer. Cuidei do meu companheiro na saúde e na doença, na vida e na morte." Seis meses depois, Grippi deu início à batalha por seus direitos, entrando na Justiça pela herança deixada pelo capitão. Este processo corre na Vara Cível até hoje. Já em setembro de 2009, ingressou com nova ação na Justiça Federal, solicitando parte da pensão. Desta vez, a decisão do juiz Renato Grizotto Júnior foi rápida e garantiu a Grippi um terço do benefício. A união estável foi comprovada por meio de testemunhas, como vizinhos, funcionários de imóveis do casal e amigos em comum.


Postura fez a diferença.

A advogada que acompanhou o caso e acabou virando amiga pessoal de Grippi considera que a postura mantida por ele durante todo o processo foi fundamental para o sucesso. Na avaliação dela, Grippi mostrou, o tempo inteiro, possuir uma preocupação muito além de bens materiais; estava interessado em fazer valer os direitos que lhe cabiam. "Fiquei super realizada. Na verdade, não tinha dúvida alguma que ele ia conseguir. Eu e ele não tínhamos ideia que ia andar tão rápido", diz Julimar Dutra Pironi.

Em coro com a advogada, ele faz questão de frisar que toda a luta foi um ato de coragem. "Quando pensei em pedir a pensão, pesquisei na internet, mas não tinha nada que me desse suporte. Muita gente achou que eu não pudesse ganhar. Nunca pensei que eu fosse tão corajoso do jeito que eu sou."


'Direito tem que acompanhara sociedade'

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Minas Gerais, Luis Cláudio Chaves, que esteve ontem em Juiz de Fora, participando de um projeto da ordem, a decisão do pagamento do benefício mostra uma tendência no Judiciário, em relação a casais do mesmo sexo. "O direito tem que acompanhar a sociedade. Se existem fatos jurídicos, a Justiça tem que se pronunciar." Como Chaves explicou, o Supremo Tribunal Federal (STF) já reconhece a união homoafetiva para direitos previdenciários e patrimoniais, além de questões relativas à adoção. "Existe ainda uma resistência em relação ao reconhecimento da união estável", pontuou. Ainda, de acordo com ele, o caso em questão pode ser o primeiro em Minas, relacionado ao Exército Brasileiro.


O presidente da OAB em Juiz de Fora, Wagner Parrot, também comentou o fato, lembrando que decisões do tipo já ocorrem em todo o Brasil. Como classificou, conforme esses direitos são conquistados, dão subsídios para que outras decisões favoráveis sejam tomadas. "E isso não tem volta", frisou. Em Juiz de Fora, de acordo com ele, a OAB já possui uma comissão específica para discussões acerca da diversidade sexual. "A Justiça não pode tapar os olhos para o que está acontecendo. São casais que já vivem juntos, constituem família e adquirem bens."

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