Enigmático, religioso, tímido, solitário e muitas vezes, melancólico, deslumbrou o mundo com o seu enorme talento, vivendo vitórias sucessivas.
Ayrton Senna da Silva nasceu em São Paulo, no Bairro Santana, na rua Pelo Leme, nº17, a 21 de Março de 1960. Filho de pais abastados, a sua infância decorreu sem sobresaltos. Milton da Silva e Neide de Senna da Silva constituíram um casal unido, que soube sempre o que era solidariedade. Mais tarde, o próprio Ayrton escrevia: "Se cheguei onde cheguei e consegui fazer tudo o que fiz, isso se deve em grande parte a ter tido, mais do que tudo, a oportunidade de crescer bem, num bom ambiente familiar, de viver bem, sem qualquer problema económico e de ser orientado no caminho certo, nos momentos decisivos da minha vida." A irmã, Vivianne, nascera dois anos antes e viria a dar-lhe três sobrinhos - Bianca, Bruno e Paula. Havia também mais um filho, de nome Leonardo. Como todas as crianças da sua idade gostava de jogar à bola na rua e de caçar passarinhos. Quando fez quatro anos teve a sorte de receber, como presente do pai, um Kart. Foi uma alegria imensa! O tempo faria dele um perfeito piloto. Não sentia medo e confiava na sua habilidade. Tratava cuidadosamente dos seus motores. Foi aprendendo os segredos da velocidade. Realizou os primeiros estudos no Colégio do Bairro, passando, a seguir, para o Colégio Rio Branco, em 1970, para fazer o curso ginasial, tendo-o completado em 1978, com 18 anos. Foi-lhe, então, passado o respectivo certificado, que lhe conferiu o título de Auxiliar de Escritório de Edificações e apto a prosseguir estudos a nível superior. Mas a sua vontade estava bem definida. Ele seria piloto para o resto da vida.
E as corridas começam...
Com oito anos Ayrton entrou, pela primeira vez, numa corrida de Kart, a título particular. O seu pouco peso era-lhe favorável. Não foi bem sucedido: "A três voltas do final, quando estava em terceiro, o piloto atrás de mim tocou-me e eu saí da pista. Não terminei a corrida, mas foi divertido." Em 1973, tinha ele treze anos, correu em Interlagos. Foi a sua primeira vitória e, duas semanas depois, alcançou o primeiro lugar na categoria Júnior nos Campeonatos de Inverno. Com menos de catorze anos conseguiu o seu primeiro campeonato paulista. O primeiro contrato de fábrica surgiu em 1978. Era o Grande-Prémio de Itália. Foi considerado "Revelação do Ano". Em 1979 veio correr em Portugal, no Estoril, depois de ter sido Vice-Campeão Sul-Americano em San Juan. As suas corridas em Kart deixaram-lhe grandes recordações. "O Kart deu-me muitos momentos de prazer e deixaram-me gratas recordações. Nunca a pilotagem foi tão divertida."
Em Novembro de 1980 fez o seu primeiro teste num carro de competição de Van Dieman, mas não gostou muito: "Pensei que era muito difícil guiar este carro." Nesse tempo morava com Lilian Vasconcelos Sousa, com quem veio a casar em Fevereiro e passou a viver numa casa, tava desiludido com o automobilismo e com o próprio casamento. Resolveu abandonar e voltar ao Brasil: "Voltei para casa para ajudar o meu pai no trabalho." Mas os seus serviços de escritório eram para ele um suplício. Sentia-se preso aos automóveis, que eram a sua grande paixão. "Tentei abandonar a competição, mas não consegui. Por isso, em Fevereiro percebi que não podia continuar no Brasil enquanto a temporada estava a começar na Europa." Os pais concordaram. O regresso não se fez esperar. Van Dieman estava interessado em tê-lo ao seu serviço. Voltou a Inglaterra, no início da temporada de 1982, e a 28 de Março venceu em Silverstone, embora sem travões dianteiros. A 4 de Abril em Donington e a 9 do mesmo mês conseguiu o circuito de Snetterton.
Era finalmente a Fórmula 1. Os campeonatos sucederam-se e o sonho do jovem Ayrton estava, assim, realizado. Em 1984, com 24 anos era já um verdadeiro campeão. Acumulou um currículo de 161 corridas, 65 poles-positions, 41 vitórias. Três vezes Campeão do Mundo em 1988, 1990 e 1991 o seu nome jamais deixou de ser respeitado e venerado. Para lá de se ter revelado um dos mais extraordinários pilotos de Fórmula 1, Ayrton começa a mostrar outras particularidades em relação aos seus colegas de profissão. Nele, tudo é levado ao limite. A vida é vivida nos extremos máximos. O trabalho é um dos seus únicos interesses e, na definição do jornalista português Domingos Piedade, Ayrton Senna "é um ET, um ser de outro planeta, cuja dedicação ao trabalho não é igualada por nenhum outro piloto." Para o conhecido comentador de Fórmula 1, "Ayrton trabalha 24 horas por dia e Prost só perde para ele porque trabalha 17 e dorme as outras 7."
A Religião...
É aqui que surge o lado místico de Senna. Católico, o piloto afirma ter passado por experiências que o fizeram "entrar noutra dimensão". Ayrton conta que depois do acidente em 1988, Deus começou a falar-lhe através da Bíblia e que, no Grande-Prémio do Japão, no mesmo ano, quando ganhou o seu primeiro título mundial, Ele lhe apareceu nas duas últimas curvas da prova. "Eu estava a agradecer-Lhe pela vitória. Mesmo rezando eu estava superconcentrado e preparava-me para dar uma curva longa de 180 graus, quando vi a imagem de Jesus. Ele era tão grande, tão grande... Não estava no chão. Estava suspenso com a roupa de sempre, a cor de sempre e uma luz em volta. O seu corpo inteiro subia para o alto, para o Céu. Ao mesmo tempo que guiava um carro de corrida eu tinha a visão dessa imagem incrível."
Os amigos...
Com a ajuda de Deus ou sem ela, a verdade é que Ayrton era um sobredotado até biológicamente. O seu coração, por exemplo, tem um ritmo invulgar de bombear sangue para o corpo com um esforço mínimo. O preparador físico brasileiro Nuno Cobra, que tratava de Ayrton, diz que a frequência cardíaca do piloto está entre "44 e 46 batidas, o que mostra a enorme capacidade cardiovascular dele". Se não tem muitos amigos fora das pistas também não se pode dizer que os tenha lá dentro. Mas o facto pode não ser da sua responsabilidade. É o seu feitio reservado e o seu empenhamento na vitória e em bater todos os recordes existentes que o levam a afastar-se dos seus pares e ao mesmo tempo o tornam um alvo fácil de invejas e ódios mesquinhos. Dizem os amigos que a tensão em que ele vive só abranda quando bater todos os recordes da Fórmula 1. E muitos já lhe pertencem...
1 de Maio de 1994...
O acidente fatal de Ayrton Senna em Imola deixou a Formula 1 em tumúlto, revoltada pela brutalidade do desaparecimento do seu maior ídolo da actualidade. A F1 continuou, claro. No entanto jamais será a mesma sem Ayrton. Para o povo brasileiro fica a saudade e a perda de um sonho e de um orgulho nacional. O Brasil perdeu uma das suas bandeiras e saiu á rua para se despedir do melhor piloto da última geração, um dos maiores pilotos de todos os tempos. Cerca de 250 mil pessoas esperavam em S. Paulo o avião que transportou o corpo do piloto; mais de 200 mil acompanharam o velório; todos os momentos foram seguidos por vários canais de televisão. Os brasileiros reviam-se no homem tímido e com cara de menino que não dava tréguas na pista, sempre á procura de mais uma vitória, de menos um centésimo de segundo.
O Deus dos circuitos, para quem não havia justificação, seja em que circunstância for, para um segundo ou terceiros lugares. Vencer é como uma droga, admitia Ayrton. Especialista em andar nos limites, as suas 65 pole-positions ficarão por vários anos como um dos recordes a abater. Ayrton Senna entrou para a Formula 1 em 1984, depois de uma carreira vertiginosa e vitoriosa nos kartings e nas fórmulas de promoção, sobretudo na Inglaterra. Nesse ano teve a sua pior classificação num mundial, um nono lugar com a equipa Toleman. Depois na Lotus e na McLaren, nunca deixou de estar entre os 4 primeiros. Ganhou três títulos mundiais e venceu 41 grandes prémios, teve 24 acidentes em corrida - o último foi fatal.
Muito religioso e impulsivo, Ayrton era um homem à parte na Formula 1. A sua atenuada tendência de ferver em pouca água, aliada a uma condução notável, geraram-lhe muitas inimizades, como foram os casos mais marcantes de Nelson Piquet, Alain Prost e Nigel Mansell. Quase insuperável em piso molhado, Ayrton foi campeão do mundo em 88,90 e 91. No entanto a sua carreira foi brutalmente interrompida em Imola.
Grande Prémio de San Marino, 1 de Maio de 1994. À última volta, segunda depois do safety car abandonar a pista, o Williams Renault nº2 passa a fundo a reta da meta mas não completa a curva Tamburello, seguindo em frente a cerca de 300 Km/h. Do violento acidente resulta a morte de Ayrton Senna da Silva, 34 anos, brasileiro, tri-campeão mundial de Formula 1.O ídolo Ayrton Senna deixou-nos e fez chorar todo o mundo. O recorde de pole-positions dificilmente será batido.
MAIS UM DOMINGO SEM AYRTON
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