A passagem de ano nunca teve um clima tão otimista para os jovens das favelas da Rocinha e do Vidigal. Este foi o primeiro réveillon desde que a polícia ocupou as comunidades, expulsando os traficantes e iniciando um processo de pacificação. Mas todos sabem que a batalha não está ganha. O ano que começa vai ser decisivo para moradores atuantes como o estudante Flávio Carvalho, de 25 anos, repórter do site "Favela da Rocinha". Ele está cheio de esperanças, mas tem plena consciência de que ainda há um longo caminho para ser trilhado.
- Não digo só que é necessário ter educação escolar, mas, principalmente, cidadania para todos. As pessoas precisam saber quais os direitos delas e o que fazer se sentirem que eles estão sendo violados - argumenta o aluno da PUC-Rio, que cresceu na favela. - Para onde se liga quando falta luz ou quando tem lixo na porta de casa? Essas orientações precisam ser ensinadas às pessoas daqui.
Flávio participa do grupo de discussão "Cidade Unida", formado por cerca de 30 integrantes, muitos deles jovens moradores de favelas ocupadas que se reúnem para discutir problemas de cada área. Nos três encontros realizados até agora, falou-se muito em educação e saneamento básico. Segundo Flávio, é preciso acabar, por exemplo, com os diversos valões de lixo na Rocinha. E uma solução, comenta ele, pode começar com a abertura de cursos sobre direito civil e cidadania.
Educação é a maior bandeira do grafiteiro Wark, outra pessoa engajada dentro da comunidade. Quem anda a seu lado pela Rocinha precisa parar a cada cinco minutos e esperar enquanto ele conversa com moradores sobre os planos de algum evento cultural. Desde adolescente, o rapaz grafita nos muros da favela. Aos 16 anos, dava aulas de pintura a amigos e, hoje, tem turmas de até 35 alunos em seu estúdio, na Estrada da Gávea. Mas as vendas das telas de Wark são a única fonte de renda do local, onde também funciona um instituto que ajuda adolescentes a voltar para a escola.
- Meu grande desejo para 2012 é ver projetos como o meu recebendo mais incentivo, privado ou público. Crianças não podem ficar sem educação. Quero atrair a garotada com o grafite, e aproveitar para proporcionar aulas de informática, leitura e cidadania. A ocupação vai trazer tranquilidade para a comunidade, mas é preciso ter educação também - afirma Wark, que, recentemente, grafitou a vaca "Dona Rocinha" para a famosa mostra Cow Parade.
A assistente social Carolina da Fonseca, de 26 anos, mora na Tijuca, mas se envolveu com a realidade das favelas e foi trabalhar como voluntária na "Estilo Livre", rádio comunitária do Vidigal, onde participou de programas falando sobre bullying, gravidez na adolescência e outros assuntos. Mesmo sendo assídua no local, Carolina ainda ouve a mãe alertar sobre os perigos de se transitar por lá. A voluntária sabe que ainda são necessários tempo e trabalho para melhorar a imagem da comunidade, depois de décadas de domínio dos traficantes.
- É muito difícil tirar o estereótipo da cabeça das pessoas - comenta a garota, que encontrou o trabalho através da ONG Viva Rio. - Espero que as crianças, agora, tenham onde brincar com tranquilidade. E que os policiais sejam cada vez menos corruptos.
Do outro lado da cidade, no Complexo do Alemão, os moradores já convivem há mais tempo com a presença dos policiais, que ocuparam a comunidade no fim de 2010. Ao longo dos últimos 12 meses, a área recebeu eventos, projetos sociais e melhorias de infraestrutura, como o teleférico que já transportou mais de um milhão de pessoas. Em março, chega a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Editor do jornal mensal "Voz da Cidade", o estudante Rene Silva, de 18 anos, lista seus pedidos para 2012.
- Espero que a estrutura pública dos bairros chegue à comunidade. Os moradores não querem mais viver de "gato". Queremos pagar impostos e ter acesso a luz, saneamento, escolas... Espaços culturais também são importantes para os jovens, para que eles possam ter acesso a livros, computadores e discutir ideias - afirma Rene, que ficou conhecido ao cobrir a ocupação do Alemão via Twitter.
Tudo isso daria aos jovens dessas comunidades algo que Mariane Souza, de 19 anos, moradora da favela da Mangueira, considera essencial: uma ocupação para quando não estiverem na escola. Ela trabalha como voluntária na ONG Casa da Arte de Educar, que auxilia no ensino de crianças e adultos.
- É muito importante o adolescente ter uma ocupação durante o dia. Algo como lições de fotografia, pintura e música. Mas o ideal seria implementar cursos profissionalizantes, porque eles já preparam o jovem para o futuro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário